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sábado, 18 de maio de 2013

Gay adota neta de traficantes e menina torna-se Mini Miss Brasil

UMA HISTÓRIA DE CONTO DE FADAS

Antes da conquista, garota viveu o drama de perder a visão do olho direito. Para a capixaba Ana Clara, superação deve-se ao carinho do pai adotivo.


A rotina de preparação para concursos de beleza e ensaios fotográficos passa longe da vida que Ana Clara Ferrares, de 10 anos, levava há apenas dois anos. A estudante é neta de traficantes presos no Espírito Santo e enfrentou a perda da visão do olho direito em um acidente. Hoje, ela se define como uma criança feliz, após ser adotada aos oito anos pelo missólogo Guto Ferrares, que é homossexual. Em abril deste ano, ela foi eleita Mini Miss Brasil Oficial 2013, em concurso realizado em São Paulo, uma conquista que a menina levou para o pequeno município de Aracruz, no Espírito Santo.
No Espírito Santo, a oportunidade que Ana Clara teve é bem diferente da realidade de crianças com mais de três anos que esperam para ser adotadas. Em todo o estado, segundo o Tribunal de Justiça (TJ-ES), 132 crianças e adolescentes esperam por um novo lar e o número de pretendentes habilitados passa de 750, mas em geral, a adoção de recém-nascidos e menores de dois anos é preferência entre esses pais. Para incentivar essa ação, foi criada a I Campanha de Incentivo à Adoção Tardia, no município da Serra, na Grande Vitória, que acontece de 19 a 24 de maio.
O pai adotivo Guto Ferrares, de 25 anos, contou que os pais biológicos da filha eram foragidos da polícia e ela morava com os avós, em Colatina, no Noroeste do estado, mas eles tinham envolvimento com o tráfico de drogas e foram presos. Ana Clara acabou morando com vizinhos por algum tempo.
Mas as dificuldades não pararam por aí. "Quando ela morava no bairro São Judas Tadeu, em Colatina, um bandido da comunidade foi preso e os moradores resolveram soltar fogos para comemorar. Um dos foguetes caiu em cima da casa que ela morava e o telhado explodiu. Um pedaço bateu direto no olho direito dela e a cegou", contou Guto.
A história de Ana Clara chegou aos ouvidos do pai adotivo através de uma amiga da mãe dele, que é moradora de Colatina. Guto contou que se comoveu com a história e como já tinha vontade de ser pai, mas nenhuma pretensão de se casar, resolveu ver se havia alguma maneira de adotar a garota. "Três meses depois do acidente, a menina fez uma cirurgia no olho e foi nesse dia que a gente se conheceu. Fui bem devagar com ela, de início não falei que eu a adotaria, falei que era um amigo e que ela passaria uns dias comigo, para ver se gostava", lembrou.
Para a garota, as dificuldades foram superadas com a ajuda de um grande aliado: o carinho do pai adotivo. “A adaptação foi fácil porque a minha nova família me recebeu de um jeito muito carinhoso, muito diferente do que eu recebia na vida que tinha antes. Com meu pai foi ainda mais especial, porque na verdade eu nunca conheci meu pai biológico. Ele é a pessoa mais importante da minha vida e hoje tenho uma família completa”, disse a menina.
Guto, que é homossexual, chegou a pensar que seria difícil explicar para Ana Clara que era um pouco diferente da maioria dos pais. "No início, ela não sabia o que era gay. Expliquei à ela que era um pouquinho diferente do que ela estava acostumada a ver, que não namoraria uma mulher. Acredito que a criança é o que os pais passam para ela, adquire valores. Eu sou um pai bem rígido, quero o melhor para ela, portanto em casa não existe preconceito e nem falta de educação", falou.

Ajuda para recomeçar


A menina simpática, descontraída e vencedora de concursos de beleza chegou à casa de Guto totalmente retraída, sem conseguir conversar muito com as pessoas. O pai, então, procurou uma ajuda psicológica para ajudar a filha a superar os traumas de infância.
"Hoje ela é uma criança totalmente diferente, bem resolvida. Na verdade, ela fez um tratamento psicológico só por seis meses, foi uma espécie de preparação para a nova vida, um empurrão. Ela realmente deixou tudo o que viveu para trás, foi muito forte, e passou a me tratar como se eu sempre tivesse sido o pai dela", contou Guto Ferrares.
Guto também comentou as mudanças que a paternidade trouxe para sua vida. "Eu não paro para pensar que eu fiz parte da evolução dela, penso no que construímos juntos, que ela tornou minha vida mais especial. Hoje ela trata a dificuldade da visão como superação, encara a diferença dela como algo positivo, isso é maravilhoso."

Mini Miss Brasil


Já adaptada à nova casa, Ana Clara Ferrares contou ao pai que sempre teve o sonho de ser modelo, mas se considerava aleijada por ser cega de um olho. O apoio e o conhecimento de Guto foram essenciais para que a menina não desistisse de suas ambições. "Sou missólogo, um preparador de beleza de misses e misters, então tive segurança para conversar com ela sobre isso. Expliquei que ela não era aleijada, que era bonita e poderia ser o que quisesse. Contei que existem modelos de todos os tipos, até mesmo uma que é surda", explicou.
Um dia, a menina pediu para começar a competir em concursos de miss, acreditando que o pai seria o primeiro a apoiá-la, mas essa não a primeira reação. "Tinha medo que ela perdesse algum concurso e ficasse para baixo, não queria vê-la sofrer. Mas ela cabou contando tudo para a psicóloga dela, que me 'deu um puxão de orelha', falou que seria importante para ela", disse. Desde então, a garota passou a colecionar títulos. Em 2011, ela ganhou o Mini Miss Espírito Santo 2012. No ano seguinte venceu o Mini Miss Brasil Fotogenia 2013 e foi chamada para a seleção do Mini Miss Espírito Santo Oficial, que também venceu. No dia 27 de abril deste ano, ela ganhou o Mini Miss Brasil Oficial e agora vai disputar, na categoria dela, o concurso de Miss Universo em Buenos Aires, no fim deste ano.
Ana Clara gostou tanto da experiência que agora faz parte de seus projetos para o futuro continuar desfilando. "Eu descobri que adoro participar de concursos e desfiles e quero seguir uma carreira.

Adoção tardia


Segundo a juíza da Vara da Infância e Juventude da Serra, Gladys Pinheiro, as pessoas dispostas a adotar querem recém-nascidos ou bebês. “Nossa cultura já está mudando, mas ainda precisamos trabalhar e repercutir a importância dessa ação com as crianças mais velhas e os adolescentes. Geralmente, elas costumam ficar em abrigos até atingirem a maioridade”, disse.
Mas essas situação não se encaixa no caso de Guto e Ana Clara. Foi de uma relação inical de amizade que surgiu o amor de pai e filha, sem se importarem se não tinham o mesmo sangue. A idade da menina, então com oito anos, não foi um empecilho. "O melhor de ser pai é poder passar todo o meu carinho e o amor para ela, e esses sentimentos não medem idade e nem deixam espaço para preconceitos", disse.